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Setembro: o mês dos Orixás e dos Erês

Lettiere 03/09/2025 Erês e Crianças Espirituais
Setembro: o mês dos Orixás e dos Erês

O culto aos Orixás, às divindades e às entidades espirituais que hoje conhecemos no Brasil, nasceu de um processo profundo de resistência, preservação cultural e sincretismo religioso. Quando homens e mulheres foram trazidos da África Ocidental, principalmente das regiões que hoje correspondem à Nigéria, Benim e Angola, trouxeram consigo sua fé, sua língua e sua forma de se relacionar com o sagrado.

Na língua iorubá, tão presente nas casas de Candomblé e também na Umbanda e no Ifá, uma saudação importante é:
“Ẹ kú ìbàjẹ́” – respeito às tradições.
Cada rito carrega em si a memória dos ancestrais, transmitindo axé, energia vital, de geração em geração.

O Candomblé, ou “Kànbámblé” (do termo ka, celebrar; mbámblé, aquilo que se celebra junto), se organizou no Brasil com a Nação Ketu (iorubá), Jeje (daomeana) e Angola (banto). Já a Umbanda, nascida no início do século XX, trouxe uma síntese afro-brasileira com o catolicismo popular e o espiritismo kardecista. No Ifá, tradição diretamente iorubá, preservam-se rituais em língua original e oferendas precisas, sempre iniciadas por Èṣù, o senhor dos caminhos.

Em todas essas tradições, as comidas sagradas (àkúnlèyàn) são pontes entre o mundo humano (ayé) e o espiritual (òrun). O feijão fradinho de Oxum, o feijão preto de Ogum, o amalá de Xangô, os doces de Oxum na Umbanda, o galo e a cabra do Ifá… tudo é preparado com rigor e carinho, porque, como dizem os antigos:
“Àṣẹ ni gbogbo nkan” – tudo é axé.

Os Erês e o mês de setembro

Mas é em setembro que a ancestralidade se colore de alegria e inocência: é o mês dedicado aos Erês, também conhecidos como Cosme e Damião, Ibêjis, Ibeji, Erês ou Crianças.

Eles não são espíritos infantis desencarnados, mas forças espirituais que se manifestam em forma de criança, trazendo leveza, vitalidade e esperança. Brincam, dançam, gargalham e, por trás da ingenuidade, carregam ensinamentos profundos. São a ponte mais doce entre os Orixás e os homens.

No Brasil, por influência do catolicismo, os santos gêmeos Cosme e Damião foram associados aos Erês. E, através do sincretismo, nasceu a tradição do 27 de setembro, quando fiéis distribuem doces, bolos e brinquedos às crianças. Não é apenas um gesto de fé: é também um ato de resistência cultural, partilha e comunhão.

A mesa dos Erês

Em qualquer terreiro, em setembro, as comidas dos Erês são uma festa de cores e sabores:

  • Caruru – quiabo refogado no azeite de dendê com camarão seco e temperos, servido com arroz, farofa e acarajé.
  • Amalá – quiabo com azeite e carne, muitas vezes em celebrações ligadas a Xangô.
  • Bolos e doces – cocada, maria-mole, brigadeiro, paçoca, pirulito, balas e bolo simples.
  • Frutas – banana, laranja, goiaba e outras, sempre frescas.
  • Bebidas – sucos e refrigerantes, oferecidos com alegria.

Cada ingrediente é simbólico: o quiabo traz suavidade, o dendê carrega energia vital, o mel adoça os caminhos, o amendoim e o coco representam fartura.

A herança cultural

Celebrar os Erês em setembro é celebrar a infância espiritual, mas também é manter viva a memória dos que resistiram. Quando as crianças recebem doces nas ruas, quando os terreiros entoam cânticos em iorubá e quando as famílias repartem suas oferendas, tudo isso é a continuidade de um saber ancestral.

Como dizem os mais velhos:
“Àgbà kì í wà lọ́jà, kí orí òmọdé ò ní bàjẹ́.”
Quando os mais velhos estão presentes no mercado, a cabeça dos mais jovens não se perde.

Assim é setembro: mês dos Orixás, mês dos Erês, mês em que o riso das crianças ecoa como reza e o doce oferecido se transforma em axé.

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